sexta-feira, 31 de maio de 2013

O uso de instrumentos econômicos é um caminho para a conservação

A Mata Atlântica é beneficiada com o pagamento de serviços ambientais 
Pagamento de Serviços Ambientais (PSA), compensação ambiental, ICMS Ecológico são alguns tipos de instrumentos econômicos que podem ser utilizados para conservação da natureza ou mitigação de impactos. Eles são amplamente utilizados em políticas públicas em vários países para corrigir falhas de mercado e aumentar a eficiência da economia. No entanto, “sua natureza está fortemente associada ao objetivo de política”, explicou Ronaldo Seroa da Mota, professor da UERJ. Ele apresentou um panorama para embasar conceitos econômicos que permeiam esse assunto na mesa “Aplicabilidade de instrumentos financeiros para conservação e promoção do uso sustentável dos recursos naturais”, dentro da programação da Semana da Mata Atlântica 2013.

Da esquerda para direita, Rui Rocha, Rubens Rizek, a coordenadora da
mesa Helena Carrascosa, da SMA-SP, Ivy e Seroa da Mota, da UERJ.
(Foto: SIlvia Marcuzzo)
 
Seroa da Mota salientou que os custos e o contexto de cada situação é que vão definir o tipo instrumento a ser utilizado. Um exemplo de PSA apresentado foi o que vem sendo  utilizado pelo município de Extrema, no Sul de Minas Gerais, que aposta na conservação da natureza há mais de 15 anos. Com o envolvimento da comunidade, através da proteção de suas nascentes, a população do município recebe pela “produção de água”. Vem de lá boa parte da água que é consumida por quase metade da população da Região Metropolitana de São Paulo – cerca de nove milhões de pessoas.

O Estado de São Paulo lançará no próximo dia do meio ambiente o projeto Cerca Viva, um tipo de PSA, com financiamento a fundo perdido, para que os produtores rurais cerquem suas Áreas de Preservação Permanente (APP). Esta informação foi apresentada pelo secretário adjunto da SMA/SP, Rubens Rizek, um dos palestrantes da mesa. Ele disse que o Estado conta com marco legal para PSA e está à frente em relação a outras realidades brasileiras.
Citou a experiência com a bacia hidrográfica Piracicaba-Capivari-Jundiaí, onde o município de Extrema está inserido, e outras sete formas de utilização desse tipo de instrumento no estado. Essas experiências permitem que sejam apontados gargalos e entraves que impedem o avanço da aplicação de instrumentos financeiros para a conservação.

Entre os desafios citados por ele, estão a baixa eficiência da aplicação das medidas estabelecidas no licenciamento ambiental e dificuldades com a burocracia pública. Segundo Rizek, que é coordenador da Comissão Paulista da Biodiversidade, os esforços para a mitigação de impactos por parte do empreendedor são muito mal direcionados. “São Paulo emitiu 35 mil 
licenças em 2012, isso não tem paralelo no mundo, sem falar em empreendimentos de alto impacto”. Rizek argumenta que não adianta incluir o plantio de mudas, se as plantas provavelmente vão morrer por falta de cuidados. “Existe uma cultura de se desperdiçar esse esforço e a culpa é do poder público, que não tem inteligência, criatividade em projetos”, acrescentou.

Já Rui Rocha, diretor do Instituto Floresta Viva, do Sul da Bahia, acredita que o problema maior é o modelo econômico vigente, que não apresenta respostas para os problemas da atualidade. O ambientalista citou a sua região, onde propriedades que produziam cacau estão se transformando em fazendas de gado. A crise ocorre devido ao baixo preço pago à matéria-prima do chocolate por influência dos valores da fruta produzida na África. Ele defende a ampliação da cadeia produtiva do cacau no modelo cacau-cabruca (um sistema agroflorestal) na região de Ilhéus, onde há cerca de 500 mil hectares plantados.

Rocha entende que há formas de se valorizar os serviços ecossistêmicos e a biodiversidade. Na produção convencional de cacau, o valor que é pago ao produtor sobe duas vezes depois de ter passado pelas empresas de moagem da região e dez vezes mais após ser transformado em chocolate, em indústrias do Sudeste. Ele acredita que um modelo baseado na produção de chocolate sustentável, que ofereça condições dignas de trabalho para os trabalhadores de campo, o produto poderia ser valorizado até mais de 20 vezes. Mas para isso, seria preciso ter um olhar sistêmico da situação. E isso significa não apontar o agricultor como um criminoso, mas agente de uma nova economia, concluiu.


Exemplos de cadeias produtivas da sociobiodiversidade foram apresentados por Ivy Wiens, do Instituto Socioambiental, que juntamente com seus parceiros locais vem desenvolvendo atividades no Vale do Ribeira, interior de São Paulo. Segundo Ivy, a região tem um grande potencial para o aproveitamento de espécies nativas da Mata Atlântica. Um exemplo citado por Ivy, é o palmito juçara, que não precisa ser derrubado para dar lucro, pois o fruto oferece uma deliciosa polpa, que pode ser usada para fazer sucos, pães, molhos e doces. Acrescentou ainda o quanto as comunidades rurais podem se beneficiar com a coleta de sementes nativas, cada vez mais valorizadas por viveiros no uso de recuperação de áreas, ou também empregadas na confecção de peças de artesanato. “Isso evidencia que as cadeias produtivas também têm uma função social”, explicou.

A ambientalista aproveitou para divulgar a feira de troca de sementes quilombolas a ser realizada nos dias 23 e 24 de agosto desse ano, em Eldorado. Segundo ela, a região tem condições de oferecer um turismo de base comunitária, explorando aspectos da cultura local. Ivy sugere que além de iniciativas de restauração florestal e de manejo na propriedade, é fundamental capacitar os técnicos de órgãos governamentais para que incorporem uma visão ambiental na extensão rural. Para ela, o fortalecimento das cadeias produtivas da Mata Atlântica precisa de incentivos à organização local e também da implementação de políticas públicas em que tragam benefícios para as comunidades.



Nenhum comentário:

Postar um comentário